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20/05/24 | Sonia Pestana - Coremetro  |  Compartilhe Facebook      Twitter      Whatsapp      Linkedin      Enviar por e-mail

Reeducandas de Franco da Rocha roteirizam a história de suas vidas

Curso de roteiro cinematográfico foi oferecido por um coletivo de mulheres da região

O Coletivo Baciada de Mulheres do Juquery, de Franco da Rocha, promoveu um curso de roteiro cinematográfico, de 22 a 25 de abril, para as reclusas do Centro de Detenção Provisória (CDP) Feminino da cidade. A intenção foi fornecer instrumentos para que elas reescreverem suas próprias histórias de vida. A ação contou com o apoio da Coordenadoria de Unidades Prisionais da Região Metropolitana de São Paulo (Coremetro), pertencente à Secretaria da Administração Penitenciária (SAP).

O Baciada das Mulheres do Juquery é um coletivo de mulheres moradoras da região da bacia do Juquery, que atua desde 2015 produzindo a Mostra de Cinema da Mulher e ações audiovisuais

O diretor geral do CDP, Felipe Oliveira Lisboa Góes, entende que o projeto estimula as reeducandas a buscar cada vez mais a arte e a cultura para compartilharem suas experiências. Para ele, oportunidades como a 8ª Mostra de Cinema da Mulher fazem com que os efeitos do cárcere sejam atenuados, contribuindo para a ressocialização e reinserção social, visto que desenvolve a valorização da pessoa por meio do resgate dos princípios e valores e da cidadania.

O evento foi contemplado pelo edital 40, de 2023, para produção de Mostras e Festivais do Governo do Estado de São Paulo. Para a realização da 8ª edição, o grupo teve apoio da Prefeitura Municipal de Franco da Rocha e de parceiros, como o CDP Feminino e a Escola Estadual “Professor José Parada”, ambos no município.

Ação no CDP

A mostra contou com ações de formação em cinema. A equipe do Baciada das Mulheres promoveu a oficina de roteiro cinematográfico para 15 reclusas. As aulas foram comandadas pela fotógrafa, cinegrafista e roteirista Júlia Zulian.

O dia 25 de abril foi reservado para exibição de 4 curtas metragens, seguido de discussões sobre as diferentes realidades das mulheres e suas opressões. Dentre esses curtas destacam-se “A Velhice Ilumina o Vento”, de Cuiabá, “Surreal” e “Quando Elas Cantam”, ambos de São Paulo, além da projeção do último filme que o Baciada produziu, chamado "Nós não somos só isso", feito no ano passado, a partir de depoimentos de reclusas do próprio CDP.

Os debates foram intermediados pela jornalista Karinny Paklandd. Participaram na seção especial de curtas 12 reclusas da unidade.

Relatos profissionais

Em um retrospecto, Meire Ramos, uma das integrantes do grupo Baciada, contou que quando esteve a primeira vez no CDP de Franco da Rocha, em 2021, com a oficina de introdução ao cinema, notou o quanto aquela ação foi importante para as mulheres. Ela relatou que a equipe percebeu que muitas das reclusas já buscavam formas de se expressar através da escrita, compondo letras de música e outros textos, talvez ali o material mais acessível para elas.

Foi com base nessa realidade que o grupo decidiu trazer a oficina de roteiro com a intenção de dar ferramentas para que as mulheres continuassem escrevendo e se aprimorando, mesmo estando reclusas. “Perceber esse impacto positivo ou ouvir durante o debate das exibições dos filmes que, quando estamos no CDP, elas se sentem parte do mundo é o que nos dá sentido neste trabalho”, declarou Meire.

Em complemento, Mariana Moura, produtora da Mostra de Cinema da Mulher, que acompanhou as atividades de formação em roteiro de cinema, disse que as mulheres estavam bem focadas nos conteúdos apresentados, mostrando o desejo de aprender o máximo possível. Segundo ela, as reeducandas fizeram a atividade prática de escrita com muita disposição e atenção. “Elas são muito talentosas”, resumiu.

Luciene Pereira, também do grupo, observou que o bate-papo em torno dos curtas apresentados para reflexão foi bastante intenso, sendo impactada com cada uma das falas e experiências trazidas pelas reclusas. Ela garante que esse cenário fortaleceu sua determinação para continuar lutando pela garantia dos direitos das mulheres.

A ação da Baciada contou ainda com a participação de Ana Moraes, produtora da Mostra. Para ela, atividades como a proposta pelo grupo podem, de alguma forma, despertar uma vontade de mudança e trazer à tona talentos que estão escondidos. Ana disse que atividades culturais são importantes. “Elas nos salvam todos os dias”, afirmou.

Novas oportunidades

Entre abordagens quanto às etapas de produção, sinopses, padrões narrativos, criação de personagens, linguagem e gênero no roteiro audiovisual, as reclusas vislumbraram inúmeras possibilidades para as experiências vividas. Exemplos não faltam.

Para a reclusa K.S.O., fazer parte do curso de roteiro a fez entrar num mundo totalmente diferente da realidade vivida na unidade prisional. Por isso, J.S. considerou a ação uma boa oportunidade para aprender algo novo, enquanto D.A.O. revela que, por meio da iniciativa, pôde se sentir como um ser humano fora da jaula.

Segundo W.L.C, a ação a ajudou a entender que sua história pode ter um novo roteiro. “Enquanto há vida, há oportunidade de mudar!”, declarou. A reclusa F.O., complementa que o projeto mostra os valores de cada participante e isso motiva a ter uma nova perspectiva de vida.

O curso para R.C. é uma simples forma de interagir com outras reeducandas, mas A.N.T. vê na ação uma oportunidade de recomeço e com muita expectativa. Nesse sentido, outra aluna, M.S.S., relata que a atividade fez com que ela revesse suas prioridades, mostrando, inclusive, os erros do passado.

Na opinião de S.A.S. a oportunidade vai além de ocupar a mente. Para ela, é algo para quem quer refazer a vida. Refletindo sobre o filme “Procurando o Nemo”, que foi apresentado como exemplo de específico de um tipo de roteiro, ela se identificou com o exemplo do pai. Ela diz que, assim como o personagem, também se esforçava para proteger seus filhos, sobretudo procurando dar a eles coisas materiais, pensamento que a levou ao crime. ”Vejo que o que mais eles queriam era minha atenção. Por isso, digo que o crime não leva a nada! ”, destacou.

Já E.N.T. e J.V., que experimentaram os bancos de universidades, possuem ideias em comum quanto às suas experiências numa unidade prisional. O certo é que, quer os registros dos dias vividos no CDP virem livro ou filme, o objetivo em comum é dar destaques às histórias de vida encontradas dentro das celas do estabelecimento penal de Franco da Rocha.

Público externo

A programação da VIII Mostra de Cinema da Mulher aberta para o público geral aconteceu de 1 a 5 de maio, na Casa de Cultura Marielle Franco. Dentre as ações ocorreram oficinas, exibições de filmes e debates.

Mais informações: https://mostradecinemadamulher.com.br/

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